Contrariando o que a imprensa brasileira está noticiando recentemente, o projeto para a construção do Titanic II está estagnado. Lançado pelo milionário australiano Clive Palmer em 2012, o projeto visava construir uma réplica em tamanho real do navio, que protagonizou o acidente naval mais famoso do mundo, para operar travessias atlânticas.
Pouco depois do centenário da viagem inaugural e naufrágio do Titanic, em abril de 2012, um milionário australiano surgiu com um projeto ambicioso e ousado. Um dos homens mais ricos e controversos da Austrália, o milionário foi, à princípio, exposto ao ridículo por sua ideia, que segundo a a imprensa especializada era desrespeitosa e de mal gosto. Clive Palmer queria reconstruir o Titanic.
Enquanto administrava suas empresas, incluindo a mineradora que construiu a maior parte de sua fortuna, achou um tempo para criar um projeto real de reconstrução do malfamado navio. Chegou a fundar uma companhia para operá-lo, a Blue Star Line (a operadora original do Titanic era a White Star Line!), e promover diversos jantares e eventos para divulgação de seus planos.
Clive Palmer |
Contratou empresas especialistas no setor, como a finlandesa Deltamarin, que chegou a elaborar um projeto real para a construção de um navio semelhante ao Titanic, mas com diversas inovações tecnológicas não disponíveis na época como radares por satélite, motor à diesel e um casco hidrodinâmico capaz de potencializar a velocidade do navio.
Aos poucos, a desconfiança e incredulidade foram dando espaço ao sentimento de estranheza nos espectadores do projeto. Não só pelo real desenvolvimento de um projeto que não era, até então, sequer considerado sério, mas pelas declarações do empresário, que chegou a afirmar que manteria a divisão de classes em seu Titanic, e não só não teria nenhum tipo de tecnologia disponível a seus passageiros (não haveria nem mesmo TVs a bordo), como também proibiria que aposentados pensionistas frequentassem o casino de bordo.
Aparência da grande escadaria no Titanic II |
Neste cenário, o projeto foi se desenvolvendo, e em fevereiro de 2013, em um grande jantar promovido pela Blue Star Line em Nova Iorque, o plano definitivo foi anunciado. Em parceria com a consultora marítima Deltamarin, o estaleiro chinês CSC, a Blue Star operaria o navio na tradicional rota transatlântica entre Nova Iorque, nos EUA, e Southampton, na Inglaterra, a partir de meados de 2016.
Era necessário assinar o contrato definitivo com o estaleiro parceiro CSC, que construiria o navio, que seria o primeiro navio de cruzeiros de nível internacional e de grande porte construído na China, e um dos poucos construídos no Oriente. Palmer garantiu na ocasião que já havia um memorando de entendimento com o estaleiro parceiro, e que o contrato oficial e final deveria ser assinado até o fim daquele ano, para que o navio fosse concluído até o último trimestre de 2016.
O Café Parisien seria bem semelhante ao do Titanic original |
Clive Palmer também demonstrou sua personalidade durante o evento de fevereiro de 2013. “Eu não irei divulgar o custo, a questão não é dinheiro, eu posso pagar por isso”, respondeu quando perguntado sobre a modalidade de financiamento utilizada para a construção do navio, acrescentando: “Nós temos uma grande pilha de dinheiro, e continuaremos gastando dela até que cheguemos lá.”
Com um site online, e supostamente mais de 40,000 interessados em navegar no novo Titanic, a Blue Star divulgou até mesmo previsões artísticas e detalhes do navio, que teria essencialmente as mesmas características do Titanic, com os mais recentes avanços técnicos, um andar adicional (onde estariam elementos de segurança – como botes salva-vida modernos e suficientes – um casino e um teatro), e duas chaminés falsas, que teriam topo de vidro, e serviriam de mirante para a primeira classe.
Uma cabine da terceira classe seria assim no Titanic II |
Porém, o tempo passou, e não só o ano de 2013, mas o de 2014, terminou sem que a Blue Star Line tenha feito nenhum acordo oficial com o estaleiro chinês. Em abril de 2014, Palmer, que também é político na Austrália, justificou o atraso com uma suposta falta de entusiasmo dos chineses com relação ao projeto, e ainda culpou sua oposição pela baixa credibilidade que o projeto gozava naquele momento.
Pouco depois, em maio do ano passado, o prazo de entrega foi modificado para 2018 e um memorando de entendimento chegou a ser assinado com uma corporação chinesa, com o objetivo de promover o navio e conseguir patrocinadores e apoiadores. O plano então era iniciar a construção até meados de setembro de 2014. Um contrato com o estaleiro, no entanto, não chegou a ser mencionado pela Blue Star. Teria a pilha de dinheiro acabado?
Palmer com um de seus dinossauros |
Palmer, que também se envolveu em outro projeto promissor: a construção de uma espécie de Jurassic Park na vida real, (inaugurado em 2013), acabou se envolvendo em discussões com o partido comunista chinês, e deixou de ser uma pessoa bem vista no país de onde viria seu Titanic II. Em agosto de 2014 chegou a chamar o governo chinês de “desgraçado”, enquanto reclamava de projetos chineses na área de mineração em seu país natal, a Austrália.
Em setembro de 2014, ainda sem contrato assinado com estaleiro, e com Palmer em litígio com seus parceiros chineses, o projeto perdeu a pouca credibilidade que ainda tinha.
Desde então o site da Blue Star Line foi removido do ar, nada foi firmado com qualquer estaleiro no sentido de construir o Titanic II, e nenhuma atualização com relação ao projeto foi feita por Palmer ou sua empresa.
O mesmo dinossauro, destruído, após incêndio em março. Metáfora para seus projetos ousados? |
Em março deste ano, um jornal australiano publicou uma matéria em que retrata o projeto do Titanic II sob a visão do estaleiro CSC. Segundo o jornal, os trabalhadores da instalação chegaram a ser informados do projeto, mas nunca de fato trabalharam sequer na preparação para uma possível construção. Um deles afirma: “Esse navio era apenas uma proposta. Isso nunca foi realizado e o projeto nunca lançado”.
Nesse contexto, no final de julho de 2015, a imprensa brasileira voltou a noticiar a construção da réplica do Titanic como um projeto certo e que estaria concluído em 2016. Teriam as notícias do jantar de fevereiro de 2013 em Nova Iorque chego apenas agora nas redações de todo o Brasil?
O site da Blue Star Line continua no ar. Não foi removido.