
O SS United States voltou a navegar nesta quarta-feira (19/2) após quase 30 anos atracado no porto de Filadélfia, nos Estados Unidos.
Um dos últimos sobreviventes da era de ouro das viagens transatlânticas, a embarcação foi construída em 1952 e precisou ser retirada do cais onde estava desde 1996.
Após ver falharem décadas de tentativas de preservação, o navio partiu de seu pier rumo ao porto de Mobile, no estado do Alabama, onde será preparado para virar um recife artificial.
Durante o processo, o navio será afundado propositalmente na costa do estado da Flórida, se tornando um habitat para diversas espécies de vida marinha, além de um ponto de mergulho e turismo náutico.
Em estado precário de conservação, o SS United States passou pouco mais de uma década sob propriedade da SS United States Conservancy, uma organização sem fins lucrativos.
Liderado pela neta do projetista do navio, Susan Gibbs, o grupo chegou a considerar vários projetos para o navio, incluindo sua transformação em um centro de convenções e hotel em Nova Iorque e uma venda para a Crystal Cruises, que pretendia revitalizar a embarcação para cruzeiros de luxo.
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Nenhum projeto, no entanto, foi para a frente. Sem conseguir uma solução para preservar o SS United States, a ONG se viu obrigada a cedê-lo para o Condado de Okaloosa no final de 2024.
A operação foi o desfecho de uma longa batalha judicial entre a Conservancy e os permissionários do píer onde o navio estava atracado há quase três décadas.
Em litígio por conta de um aumento no valor do aluguel do cais, as entidades batalharam no Tribunal Distrital dos Estados Unidos por vários anos. Ainda que a ONG tenha sido considerada ganhadora do caso, a corte emitiu uma ordem de despejo para o SS United States.
Desativado desde os anos 1960
Construído nos anos 1950, o SS United States é um dos últimos navios remanescentes da época de ouro das viagens transatlânticas no Atlântico Norte.
Projetado para realizar transporte de passageiros entre os EUA e a Europa, a embarcação foi uma das mais rápidas de todos os tempos e até os dias atuais detém recordes de velocidade na rota.
Com o advento dos aviões, o navio foi desativado em 1969. Apesar de ter sido revendido diversas vezes, a embarcação nunca voltou a receber passageiros no período, permanecendo fora de serviço por mais de cinco décadas.
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Nos anos 1990, empresários planejaram uma reforma para que o navio pudesse operar cruzeiros pelo Caribe. Os interiores da embarcação chegram a ser desmontados para o início dos trabalhos – que nunca foram concluídos.
A SS United States Conservancy havia comprado o navio, em 2011, com o objetivo de garantir sua preservação. Antes, a Norwegian Cruise Line chegou a adquirir o navio, planejando uma operação no Havaí.
Blue Ribband e importância histórica
Para o fundador da Sociedade Histórica Brasileira do Titanic e pesquisador naval Victor Vila, muito da importância do navio está ligada ao contexto de seu surgimento e a conquista da Blue Ribband, um prêmio histórico disputado pelos transatlânticos que cruzam o Atlântico Norte.
“Considero tudo isso uma ironia pois, ao olhar pro mercado dos transatlânticos no Atlântico Norte e tudo que envolveu a premiação da Blue Ribband, os Estados Unidos foram protagonistas em raras ocasiões”, disse Vila, apontando a lei seca norte-americana, que esteve em vigor entre 1920 e 1933, como um dos fatores para o cenário.
“A construção do SS United States foi como uma última tentativa de sacramentar o poder industrial e tecnológico dos Estados Unidos, criando um navio para o mundo ver”, acrescentou.
De acordo com o pesquisador, o SS United States é o atual detentor do título, superando o então campeão Queen Mary em quase nove horas.
“Era algo que parecia impossível. Enquanto o Normandie e o Queen Mary disputavam o título por minutos de diferença, o Unites States ganhou por nove horas. Foi algo avassalador”, explicou.
“É um navio que veio para encerrar essa era dos transatlânticos e perdurou por muitos anos, nesse contexto de encerramento e demonstração de poder dos Estados Unidos. Mas que agora tem uma morte, digamos, apagada”, acrescentou Vila, lembrando que a embarcação segue tendo um grande grupo de fãs ao redor do mundo.
“É curioso que os norte-americanos preservaram o Queen Mary mas, em especial as autoridades do país, não tiveram o interesse e a gana de preservar o United States”, disse Vila referindo-se ao transatlântico da Cunard Line que foi adquirido pela cidade de Long Beach, na Califórnia, em 1967.
“O navio realmente foi negligenciado, abandonado. Colocado de lado quase como em um canto da vergonha, encostado na Filadélfia por tantos anos. Muita gente nem sabia o que ele era, o que representava,” acrescentou.
“É muito triste ver isso. É uma nação que sempre se orgulhou de sua história e de seus próprios feitos relegando uma de suas grandes criações, que deveria ser também motivo de orgulho”.
Texto (©) Copyright Daniel Capella / Imagens (©) Copyright Condado de Okaloosa