Considerados verdadeiras “cidades flutuantes”, os navios de cruzeiro atuais são capazes de transportar milhares de pessoas. O Symphony of the Seas, por exemplo, transporta até 6,680 passageiros, além dos seus 2,200 tripulantes.

A embarcação da Royal Caribbean Cruises Ltd. é a maior em atividade, mas será ultrapassada em breve por outra de capacidade ainda maior, o Global Dream. Em construção, o navio da Dream Cruises, transportará, de acordo com a companhia asiática, mais de 9,000 passageiros!

Portanto, é possível equipará-los realmente a pequenos municípios brasileiros, no que diz respeito ao número de habitantes destes. De acordo com o último Censo Demográfico realizado pelo IBGE em 2010, 1098 cidades no Brasil – o equivalente a 20% do total – possuem de 5 a 10 mil moradores. Dessa forma, é possível também equiparar os navios aos municípios em relação a quantidade de lixo gerada.

Como em uma cidade, as pessoas a bordo geram diariamente montanhas de lixo de todo tipo, seja de natureza orgânica ou potencialmente reciclável. Sobras de alimentos, vidros, metais, papéis e plásticos possuem composições e caraterísticas muito distintas, que refletem em diferentes impactos à natureza quando descartados de forma incorreta.

Tempo de degradação do lixo e consequentes impactos

Junto com os suprimentos, embarca o lixo

Uma vez descartado de modo não adequado, cada tipo de material leva determinado tempo para degradar no meio ambiente. Alguns chegam a causar prejuízo por inúmeras gerações. Dos mais inofensivos, o papel leva somente de 3 a 6 meses para se deteriorar por completo, não causando danos mais severos.

Os metais, das latinhas de bebidas e conservas, por exemplo, levam mais de 200 anos, e nesse meio tempo liberam metais particulados na água direta ou indiretamente. Indiretamente acontece por meio de contaminação do solo, em que, o metal atinge os lençóis freáticos. Consequentemente, os cursos d’agua são impactados até suas desembocaduras nos mares, podendo assim causar intoxicação em animais e plantas.

Já os vidros podem demorar mais de 4,000 anos para se decompor. Utensílios de vidro datados de 2000 a.C. já foram encontrados por arqueólogos. Portanto, o vidro é um produto, praticamente, anti-degradação. Garrafas de vidro abandonadas no fundo dos mares frequentemente servem de abrigo para muitos animais, formando uma espécie de recife artificial. Tal comportamento pode até parecer saudável, mas não é. O habitat natural do animal em questão acaba sendo abandonado, podendo haver um desiquilíbrio ecológico.

O grande problema dos plásticos

No Pacífico, as correntes fazem o plástico se acumular em localidades específicas, formando grandes ilhas de poluição

Os plásticos também são altamente resistentes à deterioração, levam mais de 400 anos e são considerados grandes vilões para o meio ambiente.

O Oceano Pacífico Norte é um dos mais afetados pelo produto. Nele, pode ser encontrada imensa aglomeração de pequenas partículas de plástico, concentradas devido ao movimento de correntes oceânicas. A chamada Grande Ilha de Lixo do Pacífico, com uma área estimada equivalente ao triplo da área do estado de Minas Gerais, contém partículas de plástico em sua maioria de até 5 mm. É o que chamamos de microplástico.

A degradação mecânica (movimento das ondas, correntes e correntezas), a degradação química (reações químicas na água do mar), a fotodegradação (raios solares) e a termodegradação (temperatura) decompõem o material lentamente. Nessa degradação, o material originalmente descartado – tal como garrafas, potes, lacres, rótulos e recipientes no geral – desprende pequenas partículas de plástico, muitas vezes invisíveis a olho nu.

Você pode até pensar “Se não o enxergamos, então não há problema!”. E ainda dizer “O importante é que as tartarugas, focas, pinguins (ou outros animais) não comam sacolas plásticas!”. Sim, é um grave problema que eles se alimentem de todo tipo de plástico visível a olho nu, já que ele pode causar morte por asfixia. Mas observando o problema mais a fundo, é péssimo saber que microplástico também serve de alimento e pode ser ainda mais perigoso.

Microplástico: um mal na maioria das vezes invisível

Todos os seres vivos fazem parte de uma enorme rede alimentar, composta por várias cadeias alimentares interligadas. O zooplâncton, animais aquáticos microscópicos, se alimentam do fitoplâncton, ou seja, algas microscópicas ainda menores que seus predadores. Ambos vivem dispersos nas águas superficiais de rios, lagos, mares e oceanos.

No entanto, caso haja oferta de microplástico, o zooplâncton pode acidentalmente se alimentar deste, em detrimento de sua alimentação natural. Então, dando continuidade à cadeia alimentar, o seu predador se alimentará de uma presa com baixo valor nutricional e que o deixará potencialmente intoxicado e doente. Isso se reflete consequentemente no predador seguinte.

Para se ter noção do quanto algo que pode parecer tão insignificante como o microplástico pode se tornar um imenso problema: o krill é um minúsculo crustáceo exemplo de zooplâncton; baleias se alimentam basicamente de krill; quanto mais estas se alimentarem de krill com microplástico, mais elas acumularão substâncias tóxicas em seu organismo.

O perigo do microplástico na nossa alimentação

O microplástico

No entanto, isso vale para todos os animais que se alimentam indiretamente de microplástico. Cedo ou tarde os efeitos maléficos acabam também nos alcançando, já que este foi somente um exemplo de cadeia alimentar. O krill também pode servir de alimento diretamente a nós, ou naturalmente ao salmão e outros peixes e frutos do mar amplamente consumido pelas pessoas.  

Tal ingestão involuntária de microplástico pode ocasionar contaminações por Bisfenol A e Estireno, de baixos níveis e por períodos prolongados. Ainda pode ser o motivo causador de desordens hormonais relacionadas ao controle do peso, puberdade precoce em crianças e problemas de fertilidade na vida adulta.  

Assim é possível perceber que se faz necessária a existência e o cumprimento de um plano de gestão de resíduos sólidos a bordo. Na próxima semana, trataremos do assunto, mostrando o que as principais companhias estão fazendo para garantir um descarte adequado, além de seus planos para redução do lixo gerado nos navios de cruzeiro. Não perca!

Texto (©) Copyright Natália Mendonça / Imagens (©) Copyright Royal Caribbean, Daniel Capella, Wikicommons e GaibruPhoto

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